sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Hoje, o vi



No balançar nauseante do ônibus, lá estavam meus pensamentos se misturando às paisagens que via da janela. Ele estava no cheiro do vento que me atravessava. O ônibus, vazio, levava a mim e mais duas pessoas: uma senhora e um senhor. Os dois olhavam para frente. Eu, mais atrás, olhava para a rua e já sabia que, no caminho, lembraria dos percursos que fazíamos, do riso singular, do silêncio gritante... Sem ele por perto, o que restava era o mundo com ele. Havia três anos que não o via e não sabia exatamente se continuava o mesmo, se tinha deixado a barba crescer, se em vez de usar óculos de grau, tinha colocado lentes, se ainda lembrava de mim... Ao chegar no destino, refiz os nossos passos, relembrei dos temas que conversávamos - já velhos e sem motivos para recordações. As pessoas que nos viam ali também não estavam. No entanto, a tarde explodia em seu ardente mês de setembro. Sem alarde, ele aparece. Depois de três longos anos sem notícias, lá estava ele: usando óculos, vestido modestamente com suas roupas invisíveis e um jeito peculiar de ser: o seu. Cogitei de chamá-lo, corri para perto. Ele havia entrado numa loja de produtos infantis. Será pai? Será mãe? Não quis importuná-lo. Já não faz sentido. Só eu o vivo. Ele morreu.

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